Na Mídia | Autonomia do Fisco é uma garantia para o contribuinte
A opinião do diretor-executivo da Auditece e presidente da Febrafite, Juracy Soares, foi destaque no portal Estadão nesta segunda-feira (12). Em artigo, o dirigente crítica a norma de execução 03/2019, da Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará, que restringe a atividade de auditoria fiscal.
“Ao invés de valorizar e preservar os auditores fiscais, servidores públicos ocupantes de carreiras típicas de Estado, fundamentais para o combate à sonegação fiscal e que buscam as receitas públicas para que o Estado cumpra seu papel social, é evidente o cenário de enfraquecimento e de desvalorização do Fisco e seus servidores”, aponta Juracy Soares.
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Autonomia do Fisco é uma garantia para o contribuinte
Ao invés de valorizar e preservar os auditores fiscais, servidores públicos ocupantes de carreiras típicas de Estado, fundamentais para o combate à sonegação fiscal e que buscam as receitas públicas para que o Estado cumpra seu papel social, é evidente o cenário de enfraquecimento e de desvalorização do Fisco e seus servidores.
No Ceará, em 19 de julho, a Secretaria da Fazenda do Estado publicou a Norma de Execução nº 03/2019 prejudicando sobremaneira a atividade de Auditoria Fiscal ao expor ilegalmente os auditores fiscais à suspeição vexatória e sem qualquer tipo de motivação, além de contrariar diversos dispositivos legais vigentes, em especial o Código Tributário Nacional (CTN).
A norma proíbe reuniões entre os auditores fiscais, os contribuintes e seus representantes advogados, contadores e consultores, passando a exigir a presença de uma terceira pessoa, preferencialmente, o supervisor de modo a “fiscalizar” a reunião. Daí surge uma série de questionamentos acerca da real aplicabilidade da norma. O primeiro tem a ver com a motivação. Afinal, qual a intenção dessa exigência?
Ao recair exclusivamente sobre o auditor fiscal, a determinação da Sefaz/CE trata de forma discriminatória, pois dentro do próprio órgão os servidores detentores de outras carreiras típicas de Estado, a exemplo dos procuradores, juízes, promotores públicos e delegados de polícia, não há essa exigência de que algum terceiro venha a “fiscalizar” suas reuniões com quaisquer interlocutores, cumprindo suas funções de Estado.
Outro ponto importante que precisamos destacar é que as informações fiscais, contábeis e sobre atos envolvendo os negócios da empresa fiscalizada devem ser preservados pelo Sigilo Fiscal. Essa responsabilidade recai, obviamente, sobre o auditor fiscal que tem acesso especificamente conferido em Ato Designatório, com os limites impostos pela designação. O auditor será responsabilizado se ocorrer um “vazamento” do levantamento. Nesse ponto, a norma escancara o sigilo fiscal das empresas ao permitir que um terceiro tenha acesso a essas informações que deveriam ser sigilosas.
Há, ainda, que se levar em conta que a referida norma estabelece que o contribuinte, antes da lavratura de eventual Auto de Infração, seja informado de toda a documentação que servirá de base ao lançamento tributário, conferindo-lhe o direito de anexar documentos. Ou seja, na prática há uma “importação” da fase de defesa (que deve ser exercida no Tribunal Administrativo) para a fase de Auditoria Fiscal.
O fato é que para o contribuinte cumpridor de seus deveres, a norma não trará benefícios ou sequer criará dificuldades. Contudo, para o contribuinte que quiser fazer uso desse instrumento para burlar a ação do Estado, prolongando indefinidamente a recuperação do que deve aos cofres públicos, será uma fantástica ferramenta.
Situação bastante complicada vivenciam os auditores fiscais da Receita Federal com as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União impondo duro golpe às ações de verificação de ilícitos tributários, desenvolvidas de forma objetiva, sem que determinado sujeito passivo venha a ser “escolhido”, senão por meio de uma sequência de cruzamento de dados. Esses cruzamentos, após uma série de filtros, acabam apontando indícios de irregularidades que demandam apuração de infrações tributárias que requerem um exame acurado dos auditores fiscais da União.
Não é factível que qualquer autoridade esteja acima do que dispõe nosso ordenamento jurídico. Ao fim e ao cabo, somos todos contribuintes. Um trabalhador da iniciativa privada – qualquer que seja – declara seus rendimentos e se submete à verificação por parte do órgão competente para tal (a Receita Federal). Da mesma forma, um servidor público, seja auditor, promotor, procurador, juiz ou ministro, todos se submetem ao crivo da regularidade tributária.
Se há infração deve surgir a competente, oportuna e cabível ação de recuperação do crédito tributário, na conformidade do que estabelece nosso ordenamento legal aplicável. E se há divergência, o contribuinte tem os seus sagrados direitos à ampla defesa e ao contraditório plenamente assegurados nos tribunais administrativos e judiciais.
Infelizmente o país vive num clima de intenso ataque às carreiras de Estado e, ao que parece, isso está contaminando autoridades que deveriam submeter-se à lei, exatamente da mesma forma que qualquer outro contribuinte se submete.
Os auditores fiscais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios precisam exercer suas atividades livres de ingerências políticas, pois a autonomia do Fisco é uma garantia para a sociedade e deve ser respeitada.*
*Juracy Soares é auditor fiscal da Sefaz/CE, diretor-executivo da Auditece/CE e presidente da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)