OCDE sugere que Brasil adote limites para gasto público
23/10/2013.
A Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE, na sigla em inglês, clube formado sobretudo por países ricos) sugere, em documento divulgado ontem, que o Brasil troque o sistema de metas para o superávit primário por uma regra fiscal que estabeleça limites para os gastos públicos.
A recomendação para a adoção de uma "regra da despesa" similar à vigente na Holanda faz parte da edição de 2013 de um estudo sobre a economia brasileira do organismo, divulgado a cada dois anos. O documento reconhece avanços na gestão macroeconômica e redução da desigualdades na última década, mas é salpicado de críticas às políticas fiscal e creditícia mais recentes, como antecipou o Valor em reportagem publicada segunda-feira. O estudo foi entregue, ontem, ao ministro da Fazenda Guido Mantega, pelo secretário-geral da OCDE, Angel Gurría.Um dos problemas citados são as "medidas contábeis não-usuais" usadas para cumprir as metas de superávit primário - o que economistas tem chamado, no Brasil, de "contabilidade criativa". "A clareza fiscal precisa ser reforçada", afirma a OCDE.
"O Brasil construiu uma boa reputação fiscal ao longo dos anos, mas é importante pensar como pode avançar", disse ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, o economista da OCDE Jens Arnold, chefe da divisão que acompanha Brasil e Portugal.
Para Arnold, a regra de superávit primário é "muito rígida" e dificulta compatibilizar os objetivos de manter uma dívida pública em trajetória sustentável e permitir a ação anticíclica do governo. Segundo ele, a alternativa proposta pela OCDE seria basicamente fixar uma trajetória de médio prazo para as despesas.
O economista da OCDE argumenta que, ao fixar uma meta apenas para o gasto, evitam-se os efeitos do ciclo econômico sobre a política fiscal, que se concentram na receita. "A beleza dessa regra é ser muito simples, fácil de comunicar e monitorar", disse.
A taxa de aumento do gasto público tem oscilado bastante nos últimos anos. Em 2012, cresceu impressionantes 11,1%, incluindo despesas previdenciárias. No ano anterior, aumentou 3,4%. Em 2010, foram 22,4%, em parte por incluir a capitalização feita pelo governo na Petrobras.
O governo tem, de certa forma, reconhecido as limitações do sistema de superávit primário, tanto que existem algumas discussões internas para a adoção de bandas para as metas. Na condução da política monetária, o Banco Central abandonou a antigo conceito de superávit primário puro. No seu lugar, passou a usar o de superávit primário estrutural, que expurga receitas e despesas extraordinárias e também as ligadas ao ciclo econômico.
Angel Gurría, que participou ontem de uma entrevista ao lado do ministro da Fazenda, Guido Mantega, chamou atenção para a questão da competitividade brasileira. A sugestão da OCDE é que se tente igualar o crescimento dos salários ao da produtividade. "Quando por um período prolongado o custo do trabalho sobe mais rápido do que a produtividade, temos uma queda de competitividade", disse, lembrando do caso europeu, onde o custo unitário do trabalho aumentou fortemente em países como Grécia, Espanha e Portugal, enquanto se manteve constante ou em baixa na Alemanha. Isso apesar de o bloco dividir a mesma moeda, o euro.
Conforme antecipou o Valor, o documento divulgado pela OCDE questiona a atuação do BNDES. Sobre a política monetária, a OCDE apoia o esforço feito pelo Banco Central para controlar a inflação. "Talvez seja necessário subir ainda mais os juros para fazer a inflação voltar para a meta", disse Arnold.
Fonte: Valor Online